Crônica "Os Pensamentos de Isabel"

             

    Silveira, na sala com seus pés sobre uma cadeira agarrado ao controle da tv, aguardava ser servido pela sua escrava que comprara com um anel de ouro das mãos de um senhor que não via a hora de estar livre. No começo mostrava mais interesse por Isabel, mas o tempo maltrata os que não o observam, e antecipou os dias da pobre escrava que aquecia sua barriga saliente ao pé do fogão que preparava um caldo de ovos para seu amo, o pobrezinho estava sofrendo de ressaca do sábado à noite que curtira sem a presença dela.

        Isabel estava atenta ao caldo com ovos, a quantidade em porções era de uma precisão irritante, afinal, ela tem conhecimento dos sistemas de medidas usuais, estudara e agora poderia aplicar em prática seu conhecimento. Vivia atormentada com suas obrigações do dia a dia, e passava na sua mente; se tudo estava de acordo como sempre estar como costume. Nada poderia fugir de sua perspicácia. Serviria com limão e pimenta- Ele adora – pensou.
            O domingo apenas dava os primeiros sinais do que ainda estava por vim, com o macho alfa da casa em casa e alimentado, se concentraria no café da manhã das crias, um menino trabalhoso para comer, e um menor, muito apegado à saia de Isabel.
            -Mãe, eu não quero nata no meu café com leite! Tira! Não!!!... Passa pouca manteiga!!! Me dar!!! Ela cuidava de tudo como de costume, e com carinho tirava a nata do café com leite do filho, e pedia para cuidar do irmão mais novo, mas ela na verdade pensava – Eu deveria fazer este moleque engolir esta nata com o copo e tudo! Mas era apenas um pensamento, não apresentava perigo, nunca usou de agressividade com os filhos.
            Isabel dosava bem a paz na casa, todos recebiam cuidados de realeza. Os esforços não eram medidos para que tudo ficasse em seu lugar, a sujeira, a comida e ela. Ainda era cedo da noite e todos estavam cansados, os meninos já deitados... o macho da casa. E ela? Estava terminado de lavar umas colheres quando inventou de ter pensamentos. Pensou satisfeita no domingo e em tudo que fizera nele, cozinhou, varreu, lavou e obedeceu. Poderia agora antes de deitar, ler algumas páginas do livro de autoestima que comprou nessas revistas que estão em todo lugar, mas quando olha a capa, já está emocionada pelo titulo. Amanhã é segunda- feira – pensou. Um novo dia para sua vida, poderia deitar então, mas antes, faria a fiscalização da casa para confirmar se tudo estava em seu lugar. Neste contratempo, pensou novamente: Tenho pensado demais, é melhor controlar estes pensamentos, talvez possam atrapalhar minha vida. Antes de parar de pensar, veio outro pensamento com uma impetuosidade que machucou as cavidades do coração de Isabel. E eu, qual é o meu lugar? Melhor dormir. Pensou em seguida. Sem conseguir para de pensar, Isabel deu uma carreirinha para sua cama, ficar ao lado do macho alfa, tentou dormir, mas não consegui dormir bem, pensou quase a noite inteira.
            Pensou nela e em toda sua contribuição exclusiva para os outros, alimentar, limpar e cuidar, e não pensou feliz! Fui enganada e iludida! Pensou no final. Estava revoltada com a vida que a moldava, no entanto, já no finalzinho da manhã tirou um cochilo e levantou cedo e foi preparar o café da manhã, cantarolando com a alegria de uma criada, pois tinha um novo pensamento – Eles precisam de mim.


Rogério Batista.






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